31 de out. de 2012

Crônica de uma madrugada tempestuosa

Radcliffe Roye/The New Yorker
Talvez seja o fato de minha mãe estar em Nova York a passeio ou talvez o fato de que já morei nos EUA e tenho amigos por lá. Não sei. Quem acompanha o blog percebeu que me dediquei a ficar de olho no furacão Sandy durante os últimos dois dias. Para me sentir parte do momento e ficar mais próximo do que acontecia, criei um Storify reunindo notícias, vídeos e tweets e fiz uma edição especial do meu podcast Super8ito, dedicada ao furacão. Esse raio de obsessão serviu de lição em muitos aspectos. Boas e ruins, profundas e superficiais, práticas e inúteis.

Começo por uma das últimas coisas que percebi. Sandy já havia causado muitos danos no Caribe, em Cuba, Haiti e outros quatro países. Sessenta e oito pessoas morreram e os danos materiais foram muito grandes também. A culpa está dividida aqui. Nem eu nem "a mídia" prestamos atenção ao que já vinha acontecendo. Porque nós não prestamos atenção a isso antes? Na última segunda-feira eu acompanhei tudo em tempo real e as notícias eram dadas a cada dez minutos, senão menos. Só fiquei sabendo dos números acima, os do Caribe, porque os pesquisei hoje. Essa foi uma constatação pesada. E velha, convenhamos.

Para falar de coisa boa, ficou claro que tipo de ferramenta on-line é mais desenvolta na hora em que vento sopra forte. Disparado, o Twitter foi a melhor fonte de informações durante aquela noite, apesar de várias mentiras que circularam. O governador de Nova Jersey e o prefeito de Nova York faziam atualizações a todo instante, tentando acalmar a população e informar. Quem seguia Bloomberg no Twitter, já sabia que o número de emergência 911 estava sobrecarregado e que deveria ligar para o 311. Imagino que quem estava em casa sem luz e com o smartphone à mão, ficar de olho nos tweets deve ter sido uma ótima maneira de ficar informado.

Checando o Twitter no meio do expediente. Pode, Max?
Sim, circularam milhares de fotos e notícias falsas. Tubarões em Nova Jersey, Bolsa de Valores inundada, funcionários da companhia de energia elétrica foram algumas das mentiras daquela madrugada. Demorava pouco, porém, para surgirem desmentidos, que se não se espalhavam tão rapidamente como a versão original, ainda assim ganhavam uma respeitável repercussão. O esforço para desfazer logo os mal-entendidos foi grande. Revistas compartilharam atualizações de TVs. TVs usavam informações do Twitter (e erravam às vezes).

Outro capítulo interessante e paralelo foi o uso do Instagram. Pela primeira vez, vi esse aplicativo sendo  usado para algo que não documentar bichos de estimação, refeições ou finais de semana incríveis à beira-mar. Os filtros retrô passaram despercebidos. Amaro? Quem liga quando as imagens mostram ruas destruídas, alagadas e desoladas? Para compensar, o Facebook se mostrou lento e sem utilidade nas horas mais críticas. Deixei a rede do Mark de lado e fechei a aba.

Que conclusão se pode tirar disso? Não sei bem, mas o exercício de tentar juntar informações em um só lugar certamente deu muito mais sentido à experiência de assistir a (um lado) do furacão. Devido à própria natureza da imprensa (e da humanidade, eu diria), tudo é muito mais sensacionalista do que a realidade sugere. Nova York não estava completamente no escuro, nem totalmente embaixo d'água. Foram enormes os estragos e os perigos, sem dúvida, mas a tendência é sempre exagerar.

A internet foi vilã ou mocinha? Nenhum. Certamente foi ela um grande fator para que a passagem de Sandy por Nova York fosse melhor documentada do que a pelo Caribe, de países muito mais pobres e com pouco acesso a 3G e smartphones. Mas as câmaras de TV também não estavam lá. Não havia correspondentes brasileiros tuitando ou falando em tempo real do Haiti (que eu saiba). É nisso que devemos pensar. Não só pensar nos porquês de não cobrirmos tão bem notícias que estão muitas vezes mais próximas de nós geograficamente - quanto se ouve falar de Bolívia e Chile? - mas nos porquês de nos sentirmos mais próximos de Nova York do que de Santa Catarina.

Essa é uma pergunta que precisa ser respondida, por mim e por todos nós.



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